quinta-feira, 26 de março de 2015

PEC 40/2001 - O FIM DAS COLIGAÇÕES PROPORCIONAIS EM ELEIÇÕES PROPORCIONAIS E O INÍCIO DO CARTEL NA POLÍTICA: O Outro lado da moeda 


     Culturalmente, nos caracterizamos pela desídia nas responsabilidades no exercício típico da cidadania, o que invariavelmente trará consequências, dentre as inúmeras, algumas são mais robustas, como: não haver um sinalagma entre o corpo dos representantes e dos representados, leis que são espelho de uma realidade diferente daquela da população, sensação de vácuo representativo etc.. Existem embasamentos históricos para essas características, tendo em vista que o exercício do poder político no Brasil foi sempre exercido por uma aristocracia vitalícia, não sendo incentivado um espírito ou sentimento democrático material. Esse pressuposto erigiu uma série de problemas, como total desconhecimento das conceituações e também sobre o modelo institucional e os seus arranjados práticos e teóricos - é em suma um déficit educacional propriamente dito, mas não qualquer déficit, sendo ele o mais venal, como bem nos alertou Bertolt Brecht em relação ao analfabeto político: "Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimento políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político, vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo. Desconfiai do mais trivial, na aparência do singelo. E examinai, sobretudo, o que parece habitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar." 
     Dentre as inúmeras malversações, exsurge mais essa (PEC 40/2001), de autoria de José Sarney, o "Dono do Maranhão", sobre o fim das coligações proporcionais nas eleições proporcionais - só quero alertar que essa proposta não é incoerente às conjecturações suas, sendo ele um dos agente empoderados do País, mas aos demais mortais, às minorias e aos grupos espoliados, sim. Não se deixou claro para a população quais as consequências dessa proposta de emenda constitucional, embora no ideário popular "os partidos nanicos" - como a seborreica impressa caricata chama - sejam visto como algo sem força ou inexpressivos, para a Democracia eles são um dos oxigênios que trazem alguns ares de novidade ou mesmo  de movimento ideológico, tão caro aos valores plurais, fazendo-nos pensar por outro prisma que não o da maioria, nos dando por vezes a chance de raciocinar sobre algo que nos parece natural e não o é, do outro lado, perder-se-ia, também, na representatividade geral, posto que a ambiência de concepção das leis deve ser essencialmente mosaicista, plural, cosmopolita, tendo como reflexo um legislativo representativo geral e não somente majoritário. Ainda nessa consequência, minorias que historicamente não foram vistas - é mister constar que uma das formas de se fazer ver é no ajuntamento de forças, quando socialmente não se tem uma maioria para se fazer ver, o sistema político vai e corrige essa diferença através da proporcionalidade - se fazem às luzes da institucionalidade pelo sistema representativo proporcional. 
     Certamente, como tudo nesse País, esse problema foi tratado com distorções e desapego às conceituações, justificáveis - e não aceitável - na medida do néscio populacional. Os problemas eleitorais e políticos de um modo geral são demonizados por serem mal compreendidos ou turvados por certas práticas, o que não encerra o modo como ele deveria ser tratado e para que foi criada. A Democracia é uma invenção grega das mais caras, porém, com a peculiaridade de ser uma sociedade escravagista e segregacionista, lá, a minoria da população era quem fazia parte do rol dos cidadãos, aos demais: inobservância. Felizmente, essa história mudou e onde havia apenas uma minoria com representação, passou à maioria. Como o decurso histórico é uma das formas de aprimoramento do homem enquanto ser pensante e da sociedade como produto dessa visão, vimos que o simples conceito de maioria não comportaria a complexidade de uma sociedade cada vez mais diversificada e plural, havendo necessidade de uma construção teórica que possibilitasse representação desses grupos minoritários e que necessitam de voz para não serem atropelados pelo talante da maioria - conquista civilizatória digna de nota, conste-se. Contrariamente às evoluções históricas, nasceu um movimento dos mais pérfidos capitaneados pelas elites políticas do Brasil - o que reafirmo é extremamente coerente com a sua forma de ver o governo, haja vista serem eles os donos dos grandes partidos no Congresso Nacional, sendo consensual com a sua maneira de fazer política, já que eles se beneficiaram dessas mudanças; é legítimo na medida em que eles fazem parte de uma parcela da população, não o sendo para as demais parcelas, fragmentadas em um sem nome de ideologias e opiniões; com o advento eventual da aprovação dessa PEC, criaremos os carteis políticos -, cujo intuito é o fim da coligações proporcionais. Como anteriormente afirmei, a proporcionalidade é o meio pelo qual as minorias se valem para que os holofotes da institucionalidade se virem para eles, sendo extremamente importante no processo de criação das leis com diversidades ideológicas, quanto mais fecundo o ambiente de criação, mais legítima é a lei, não atendendo somente a necessidade da maioria, mas da generalidade dos que estão sob a égide do Estado Democrático de Direito - antiga ideia do filósofo Rousseau, na figura da vontade geral. 
     As consequências serão hecatômbicas, porque os dinossauros da política circularam sem maiores pudores com propostas absurdas e antidemocráticas, embora as minorias pouco fizessem em relação aos ganhos políticos - já que para haver algum ganho é necessário antes a famigerada "força política" (traduza-se, mais corrupção, mais compra de voto, mais escrotice) -, este pouco serve muito simbolicamente - ou seja, o sentido latente é mais forte que o sentido manifesto -, agora, escoando-se por entre os dedos da legitimidade - neste ponto, faço um paralelo com a antessala da Revolução de 1789 e a convocação dos Estados-Gerais, sendo que no 1° estado estava o clero, no 2° a aristocracia e no 3° as demais classes amalgamadas na figura da burguesia; quando ocorria algum resultado imprevisto, os dois primeiros estamentos que embora divergente poderiam ser trazidos na expressão "farinha do mesmo saco", tendo em vista os inúmeros privilégios e isenções comuns, se alinhavam e votavam contra os interesses do 3° estado, porém, é do 3° estado que parture-se as forças que derrubaram os Ancien Régime. O cenário é em si lúgubre, nos resta conviver e apostar no poder de autoevolução dos movimentos sociais e políticos, aposta essa baseada mais na esperança e fé que na faticidade - os fatos dizem o extremo oposto, ou seja, que entraremos num mar de retrocesso sem igual -, mas sem elas não faria sentido apostar na sociedade e seu viés democrático, ainda somos imberbes políticos, nossas instituições são demasiadamente jovens e as tradições cidadãs não estão devidamente arraigadas, é no exercício prático das mudanças que amadureceremos e aquilataremos nossa Repúblicas, sendo imprescindível, às vezes, dar um passo atrás para dar dois à frente. 

Por Jessé Rebouças 

quarta-feira, 11 de março de 2015

A CRISE POR TRÁS DA CRISE: O PT E O DILEMA BRASILEIRO


Nos últimos períodos - principalmente após à reeleição da presidente da República Federativa do Brasil, a excelentíssima senhora Dilma Rousseff - enfrentamos sérios problemas de natureza política, com fulcro na - pelo menos sob um olhar macro-genérico - corrupção. Não existe dúvida a respeito da atual desestimulação advindas das nossas lideranças, isso é latente, mas será que é essa toda a raiz do problema?
Em todos os lugares, alaridos raivosos, desmedidos, seja nos telejornais - hoje traduzida na figura de uma banca de sensacionalismos cujo único intuito é insuflar e estimular posições canhestras na população -, seja nas residências - que não é mais, como antes, um ambiente particular, muito pelo contrário, com a atual internetworking das comunicações nos sistemais globais, as distâncias se reduziram ao alcance de um clique -, trazem os mais improváveis discursos, "nova ditadura", "é culpa do PT" etc., mas nenhum, repito, nenhum, diz qual é o verdadeiro problema que circunda a querela: identidade cultural. Todas as críticas dirigidas pelos veículos de comunicação e pela sociedade civil têm o que podemos definir como "efeito manada", presente ainda mais quando temos um encurtamento de distâncias e da acessibilidade. Debruçar-se sobre esse tema exige ausência de inépcia, porque enquanto nos escusamos de ser naturaliter superior - no sentido kantiano - nos abstemos de construir e raciocinar o porquê.
No Brasil, um velho prolóquio define a construção do caráter do nosso povo: "faça o que eu digo, não faça o que eu faço". Ou seja, o problema é muito maior que o breve lapso temporal de um governo, que a influência de A ou B, mas ínsito da nossa construção como Nação. Temos afeto ao "jeitinho", à emenda, ao alijamento das regras, sendo que o trejeito que nos define, e por corolário os políticos - nossos fieis representantes -, à lá Eneas, é a hipocrisia. É muito acachapada essa constatação, mas esse fato não retira a sua veracidade. A crise, além da política, é uma crise da vida cotidiana. O acerbo das opiniões é uma sentença de autorreprovação do povo em relação a si, o que de maneira nenhuma não deve ocorrer, mas manifestada de outra forma, podendo ganhado contornos legítimos, como por exemplo, uma sociedade com conduta retilínea, compraz à lei.  O baluarte da estupidez e da mediocridade se situa justamente no enrijecimento ou inflexões das opiniões, o que impossibilita, ululantemente, a abertura para uma propositura cerebrina e eficaz. Nossos problemas são antes educacionais e culturais - é na cultura o maior deles, nas nossas figuras de um "herói sem caráter, ou melhor, de um personagem cuja marca é saber converter todas as desvantagens em vantagens, sinal de todo bom malandro e de toda e qualquer boa malandragem" (Carnavais, malandros e heróis, Da Matta, pag. 287) - é interessante perceber uma aura de dogma nessas opiniões, o que traz mais um ponto negativo à celeuma.
Um ponto deve ser tocado, todo comportamento como modelo a ser seguido tem uma lógica da ascendente para descendente, ou seja, das classes abastadas para as menos favorecidas, consoante lição de Maquiavel, "não se pode honestamente satisfazer os poderosos sem lesar os outros, mas pode-se fazer isso em relação aos pequenos; porque o intento dos pequenos é mais honesto que o dos grandes; enquanto estes desejam oprimir, aqueles não querem ser oprimidos."(O Príncipe, Maquiavel, Cap. IX - Do Principado Civil). Eu não posso ser leviano ao ponto de exigir soluções das nossas atenazadas periferias, dos nossos caboclos, mas também não seria honesto em dizer que os problemas da Nação são unicamente (d)os políticos, porque não existe representação não legítima. Todos carregamos a nossa parcela de responsabilidade pelo atual cenário, que aliás não é nada novo, vem desde à fundação da República, ou melhor, desde à instalação do império, o que podemos dizer haver hoje é uma maior transparência, não sei se essa é a palavra que melhor classifica, refazendo, tornou-se mais difícil esconder mazelas, a publicização é um fenômeno relativamente recente - devemos lembrar que até bem pouco tempo os parlamentares gozavam da improcessabilidade penal em função de um dos aspectos da imunidade formal, exigindo-se prévia licença à respectiva casa legislativa a qual o parlamentar era pertencente. Essa mudança só ocorreu com o advento da EC 35-2001, a partir dela se tornou possível a instauração do processo-crime sem a vênia legislativa.
Nossa democracia ainda é impúbere, nossos fundamentos ainda estão se solidificando, nos reafirmar como Nação é o que precisamos, e mais, é mister fazer uso de uma das conquistas mais caras da história dos povos: cidadania. Prevista no art. 1°, II, CFRB, como um dos fundamentos da nossa República, que se faça valer tão nobiliário direito, cujo verso também é um dever, um sinalagma perfeito entre o direito de exercer e o dever de o fazer, sua sintonia traz os resultados mais belos e satisfatórios, desde que o façamos adequadamente. É no chamamento da responsabilidade que sairemos desse lodaçal de ignomínias, somos os titulares do poder, como tal, devemos agir no sentido da eteridade.
Está claro que não é satisfatória - pelo contrário, distancia-se anos-luz - para nenhum cidadão cônscio esta situação de escrotice, da ambiência de oportunismo, de roubalheira e seus congêneres, mas esse não é o enfoque, o terrorismo acéfalo e a sensação de iminente antessala de regime de exceção que querem crer que está se formando, porque não se vê resultado imediato. É óbvio, problemas dessa natureza são geralmente conjunturais, o que demanda resiliência. Saber lhe dar com problemas é antes uma características das nações desenvolvidas, sabendo ser essa uma tarefa difícil, já que diante da hegemonia da telecomunicação nas mãos uma única emissora - globo -, as visões da realidade - que não deveria ser outra senão a verdade - ficaram e estão comprometidas, principalmente por esse jogo sujo de poder que existe nos bastidores dos palácios, ambiente de um sem nome de rapace pelo dinheiro e poder.
Saber como se portar perante esse terrorismo midiático não é um tarefa das mais fáceis, haja vista termos de nos munir de certos conceitos, principalmente filtrar o que sai do talante das manipulações dos empoderados, não só, a esmagadora maioria da população recebe às informações como verdades irrefutáveis, impassíveis de questionamentos ou contraposições - o que novamente vai ao encontro dos fatores educacionais, no instinto de investigação ou mesmo capacidade para diferir o certo do improvável -, o que é um absurdo inenarrável, já que tanto há contrapontos como geralmente só têm contrapontos. Cito claramente um exemplo, há alguns dias, assistindo a um jornal da globo, apresentado por William Waack, chapado na edição de entrada: "escândalo da Petrobras" - como aliás há vários dias seguidos essa tem sido a única notícia em evidência, não que eu esteja reclamando, sendo muito correto tal maneira de agir, mas nem tanto por ser claramente psdbista (http://www.manchetometro.com.br/). Lá, mascaram dados, mantendo o enfoque no prejuízo dos últimos meses da Petrobras, não deixando claro o porquê: segurar os preços para que o nosso povo não sentisse o aumento substancial do preço do combustível em função do aumento do preço do barril de petróleo, que é enlaçado ao dólar. A mídia no Brasil tem lado, certamente não é ao lado do povo.
Nosso dilema é essa amálgama de frivolidade e complacência com a conveniência, e não com a retidão - nesse sentido, recordo-me de uma frase de Miguel Reale numa entrevista no programa Roda Viva: "o brasileiro critica sem saber e silencia por calculo." Eis, pois, os motivos geradores de vários malsãs. É preciso uma reformulação profunda no ideário axiológico da população, até lá, a extensão fiel dos valores espraiados genericamente na sociedade, quando se acerbam no nossos representantes, traz essa sensação de absentismo, de acinte à população, mas nós criamos nossos próprios demônios. Toda mudança tende ao extremo oposto, nessa levada, é temerário que o incipiente Estado Social se veja comprimido, como de fato já está ocorrendo, sendo visto como acoitamento para vagabundo, ou gente que não tem coragem de trabalhar e são parasitas sustentados pelo governo. Essa opinião tem uma origem mais profunda, nos valores das revoluções iluministas, no individualismo, nos direitos de primeira dimensão, devendo ser transposto esse pensamento retrogrado, a finalidade do Estado é servir, e servir bem àqueles que o conceberam, não sendo o Estado uma razão em si e para si, mas para todos, principalmente para os hipossuficiente. Esse terreno de contradições e interesses é o fundo de tudo o que se posta, nossas crises existenciais se afloram nas pequenas e grandes questões que estão pendentes há decênios. Portanto, o mero julgar e possivelmente o condenar dos integrantes da quadrilha que depredou o patrimônio dos brasileiros não terá efeito prático de vulto, essa quadrilha será substituída por outra, mais uma sanguessuga, mais um incomensurável nome e número de escândalos que foram abafados nos governos anteriores, já que não existia essa acessibilidade à justiça e aos meios de comunicação. Apontar saídas é uma tarefa excessivamente difícil, por isso, tão caro, característica própria dos estadistas, e no nosso caso, a exigência é abissal, a transmudação precisa ser no espírito da nossa gente, ou seja, a nossa identidade de povo. Quando nos sentirmos responsáveis e agirmos como tal, não delegando responsabilidades - de acordo com a velha parêmia "alguém precisa fazer alguma coisa" -, então o nosso destino verá mudanças substanciais, se alguém precisa fazer alguma coisa, somos nós.

Jessé Rebouças  

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Li este artigo opinativo (a íntegra está no link) e logo relacionei a uma poesia que fiz há algum tempo.


Falar em racismo reverso é como acreditar em unicórnios

Não existe racismo de negros contra brancos porque este é um sistema de opressão. Negros não possuem poder institucional para serem racistas. Djamila Ribeiro — publicado 05/11/2014 11:02, última modificação 05/11/2014 18:43. Carta Capital. http://www.cartacapital.com.br/blogs/escritorio-feminista/racismo-reverso-e-a-existencia-de-unicornios-205.html
                 
       A negra libertação aparente  

Isabel assinou na cólera

Doença historicamente paternal
Mas ainda há manchas de sangue
O preconceituoso crime racial

Zomba, zombam, Zumbi

Dos palmares, das palmadas
Barraco, favela, puxadinho
O navio tumbeiro tombou aqui

Eis o negro esplendor do sol

O canto opaco das aves libertas
O anoitecer das mãos poderosas
O esplandecer das costas surradas
Com, ainda, feridas abertas

- Viva, viva... A liberdade chegou!

Isabel, enfim, assinou
Marcou, alforriou, gritou
                                   [ o negro liberto

Vibraram as gargantas d'África

Dos cantos dançantes, o Candoblé
- Eles olharam pra nós
- Exum escutou a gente, né?

Barraco, favela, puxadinho

- Ainda me chamam de negrinho...

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Quando o homem passou a sentir vergonha de si mesmo?

O que escrevo aqui não se baseia em nenhum estudo científico ou dados históricos cautelosamente recolhidos. Trata-se de uma simples ideia que, de relume, me veio à mente, e achei que merecia ser posta no papel antes que desvanecesse, que fosse arrastada pelas correntezas do incessante rio dos pensamentos, rumo ao esquecimento. Pode ser que, futuramente, essa incipiente e bisonha ideia já esteja mais amadurecida, que tenha sido aprimorada, aperfeiçoada, ou, por outro lado, refutada e descartada. E aí talvez eu pense em revisar esta publicação com mais propriedade. Mas, por enquanto, contento-me em reproduzi-la da forma tosca e desabrida que agora se me apresenta.

Há algumas semanas, tenho lido um pouco a respeito da noção de crime e de moral, chegando à mesma conclusão a que outros homens muito mais aprestados — e que viveram em tempos onde imaginamos que tenha sido mais difícil sê-lo — chegaram, de que ambos são fatores cambiantes, que seguem o devir que escolta as mudanças sociais. De fato, penso que na vida social não há inércia. O que a sério ocorre é que a velocidade de suas transformações é inconstante. Em alguns momentos, retarda a ponto de se tornar imperceptível. Em outros, acelera vertiginosamente, como sucede nas revoluções, que lançam a sociedade no futuro.

Isto em mente, deparei-me com uma questão que me inquietou. Há uma enorme e indelével nódoa que cobre o passado humano, algo que hoje se nos apresenta tão abismático, tão contraditório com a imagem simbólica e romântica que temos de nós mesmos, que nos causa opróbrio. Nós, os antropos, que estamos no topo da cadeia alimentar, que somos o centro do universo, a imagem de Deus, cometemos atrocidades das quais nem o mais irracional e repelente dos animais é capaz. Roubos, estupros, assassinatos? Não. Isto eles fazem com a maior naturalidade, pois trata-se de uma precondição quase que inafastável à sobrevivência no meio selvagem. Mas o homem consegue ir mais além, faz tudo isso e mais sem nenhuma razão aparente.

Contudo, o que realmente me prendeu a atenção não foi os atos de crueldade que praticamos, mas o fato de sentirmos vergonha deles, pois é verdade que nem sempre foi assim. Antigamente,  a título de menção, possuíamos leis que permitiam cortar as mãos de um ladrão, que dava aos pais direito de matar os próprios filhos, e aos credores a faculdade de escravizar os seus devedores. Esta lista sombria é imensa, e ainda devemos levar em conta o fato dela ter chegado até nós fragmentada. Sua maior parte deve ter ficado esquecida nos porões da história. O que fez, então, com que tantas condutas que hoje consideramos crimes dos mais odiáveis, no passado fossem recorrentemente praticadas, e com a maior espontaneidade? Quando foi que o homem passou a sentir vergonha de si mesmo?

Aqui chegamos ao desfecho deste pequeno texto: farei a minha aposta. Foi quando o homem passou a se enxergar como o mais perfeito ser vivente da Terra. Quando resolveu olhar no espelho, bater no peito e dizer vaidosamente "eu sou civilizado". A partir daí, passou reprimir cada vez mais os carácteres que o punham ao lado dos outros animais. O autoconhecimento, seguido da vaidade seria, pois, a chave que teria desencadeado essa mudança paradigmal no comportamento humano.

Devo acrescentar: de forma alguma pretendo defender que isto se deu de um momento para o outro, como se um instante fosse suficiente para virar a história de cabeça-para-baixo. Não. Muito provavelmente, tratou-se um processo lento e heterogêneo, e que possivelmente ainda está em curso. Enfim, é uma questão deveras ampla, e que permanece em aberto. Convido quem quer tenha se interessado por ela, a dar continuidade à discussão.

Por Tállison Sousa 

sábado, 25 de outubro de 2014

O Poder Simbólico do Voto Nulo

Escrevo este texto para manifestar aqui pela primeira vez, e com atraso, o meu voto para esse domingo - coisa que, até então, só havia feito em espaços restritos, quando provocado. Tenho plena consciência de que isso não é do interesse geral, mas irei adiante, pois, apesar de tudo, este é um espaço que me foi amigavelmente concedido para o exercício do meu direito à liberdade de expressão. 
Vamos lá: já vi muitos colegas e conhecidos declararem publicamente voto no Aécio Neves ou na Dilma Rousseff e darem suas razões. Defender o voto nulo é menos comum e é dessa tarefa que me encarreguei, pois este é precisamente o posicionamento que decidi tomar nessas eleições.

Primeiramente, descarto o voto em Aécio. Não porquê eu pense que ele vá ser um governante tão catastrófico quanto a oposição mais radical prega. Pelo contrário, acredito que ele, por estar disposto a tomar 'medidas impopulares', tenha o perfil no qual uma significativa parcela dos investidores confia e, por esta razão, talvez o seu governo seja até positivo para a economia (embora este seja apenas um palpite, pois economia é uma seara que pouco entendo). No entanto, para isso, o candidato tucano terá de dar as mãos aos setores com os quais eu quero brigar. Digo isto porquê, se é verdade que na política não existe neutralidade e que inevitavelmente se tem que escolher um lado, escolhi defender os interesses das classes menos favorecidas. Eu quero exatamente isto: alguém que se levante, encare e enfrente os interesses das elites, ainda que isto signifique por em risco a economia nacional - e confesso a minha inconsequência sem hesitação. Aécio Neves está longe de ser essa pessoa, por este motivo, jamais terá meu voto.

Quanto à presidente Dilma, além das questões de ordem prática, encontro uma razão ainda maior para desejar que a vitória seja dela. Acontece que, mesmo que o PT não represente a classe trabalhadora como deveria  e poderia , a classe trabalhadora se sente representada por ele, da mesma forma que as classe média e alta se sentem representadas pelo PSDB. A derrota do partido tucano tem, então, uma grande importância simbólica, na medida em que reafirma a soberania do povo  algo que nem mesmo a opulência e poderio econômico das elites é capaz de sufocar  e, ao mesmo tempo, transmite aos aspirantes dos cargos públicos a mensagem de que não se governa sem respeitar os interesses dele [do povo] - é o que os mais reacionários carinhosamente apelidam de ditadura comunista brasileira.

Todavia, o PT também cometeu alguns erros gravíssimos que ainda não estou pronto para perdoar, como por exemplo, unir-ser a alguns dos setores mais torpes da política brasileira e abandonar bandeiras que vinham defendendo ao longa de toda a sua história, em nome da manutenção do poder. Sendo assim, decidi que só daria meu voto ao partido se enxergasse um risco real deles perderem as eleições, coisa que, a grosso modo, as últimas pesquisas a que tive acesso não têm revelado (a diferença oscila entre 6% e 8%).

Por estes motivos, endossarei o posicionamento de alguns partidos minoritários de esquerda e de outras correntes que acompanho, como o movimento zeitgeist, e farei parte da parcela dos eleitores que sacrificarão o voto em protesto, gesto que, embora não produza nenhum desdobramento prático  e já me adianto àqueles que pensarem em reprovar o meu posicionamento sob essa justificativa , possui, tal como a vitória do PT, um poder simbólico: mostra que há uma fração do povo que está insatisfeita com o nosso sistema político em sua generalidade; que não se contenta com pouco e anseia por reformas estruturais que o simples voto, a rigor, não trará; e que se recusará a votar em qualquer candidato que não assuma com segurança o compromisso de levar esta luta adiante. Essas são as duas mensagens que eu desejo esperançosamente que o resultado das urnas, com a vitória do PT e o número expressivo de votos brancos/nulos e abstenções, levem aos atuais e futuros representantes do povo brasileiro. 

Por Tállison Sousa

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

LIBERAIS E CONSERVADORES - ROBSON E HENRIQUE: A POLÍTICA CLIENTELISTA NO RN




O devir eletivo do executivo estadual está na iminência, de um lado, a mudança; do outro, a força; de um lado, o novo; do outro, o velho; de um lado, o combate à antiga política, do outro, o conhecimento da experiência. Vejo essa situação e dela concluo - com convicção – que somos alvo, por parte desses senhores, de chacota, de jocosidades, de taxações prosaicas acerca da nossa capacidade de exame e consciência. Como não, se ambos são parturidos no mesmo ventre pernóstico e venal? Dois lados de uma mesma moeda: de um lado, seis mandatos legislativos consecutivos – de 1987 até 2012; do outro, 11 mandatos legislativos consecutivos – de 1971 até hoje.

As faces antiquadas dos velhos políticos - que se "renovam" quando os seus filhos enveredam pelo mundo da "abnegação e dedicação" às causas nobres da política - são resquícios latentes da 1ª fase da nossa história republicana - quiçá da segunda fase do Brasil império, onde dois partidos, liberais (luzias) e conservadores (saquaremas), se revezavam harmonicamente no poder, gerando um ditado que ainda hoje reflete o contexto político: "nada mais parecido com um saquarema que um luzia no poder" - caracterizada pelos currais eleitorais, sinalagma entre o chefete local e o povo imediatamente subordinado.

Assim, somos levados como canoa sem leme ao bel prazer dos detentores dos destinos do povo, num movimento que parece ser legítimo – o movimento das massas atrelando-se a um ou outro candidato – e dele nada possui, pois são as opções possíveis e imagináveis para aqueles que foram inconscientemente lapidados pelos aparelhos ideológicos de controle de insurgência, se mostrando hostil apenas quando se é para defender aquilo que é o nascedouro das nossas máculas sociais e políticas mais profundas, o ancien régime

Por Jessé Rebouças

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

A DIMINUIÇÃO MAIORIDADE PENAL: UMA LUTA SEM LEGITIMIDADE SOCIAL



Não resta dúvida, em todos os lugares a violência aumentou substancialmente, principalmente nas áreas urbanas, o que gera uma miscelânea de medo, apreensão e revolta. Recordo-me, há alguns anos atrás, na minha infância, do pacato ambiente da minha pequena cidade - Areia Branca, no interior do Rio Grande do Norte, cuja população ainda é pequena, o último senso do IBGE deu um pouco mais de 25 mil habitantes - onde dormíamos de portas abertas como costumávamos dizer. Essa não é, certamente, a nossa atual realidade, pois mesmo nela, nosso pequeno pedaço do paraíso, o flagelo da violência e criminalidade se mostra latente. Dados oficiais indicam que o número de delitos cresceu, agora, é mister indagar as razões que explicam esses acontecimentos. 

O crime é um fato social, - teoria de Durkheim, embora, segundo Lucien Goldman, sua tendência "a subestimar a importância dos fatores econômicos na compreensão dos fatos humanos" se mostra latente - como tal,  suas razões se encontram no seio que o produziu. Não é original ou novo esse pensamento, pelo contrário, é relativamente antigo, mas o senso de individualidade produzido ao longo de centenas de anos numa mentalidade sustentada pela chamada vontade potestativa absoluta e sobressalente em relação às demais e fortes influências das fontes mesológicas, esta sendo o que a vulgata da população acredita. Isso de forma nenhuma me surpreende, pois as visões de mundo e suas ideologias tem uma lógica de cima para baixo - da elite para as massa. É com essa primeira alegação - individualismo do agente que pratica o crime - que inicio a querela para trazer novos prismas às questões sociais deturpadas e sensacionalizadas pelo senso comum e pelos veículos de comunicação, que cada vez mais sedento por sangue, faz o papel oposto ao do informar e conduz a população para uma espécie de vingança privada, cuja consequência tem trazido inúmeros ajustiçamentos, estes mais próximos da barbárie social que da célula da justiça. 

Pois bem, esse meu primeiro enfoque é com certeza o mais importante, pois nele reside certas justificativas defendidas pelas massas e que são falsas, como por exemplo a autodeterminação do sujeito que "escolhe" viver no ambiente criminoso. Quem já andou, assistiu um documentário ou é minimamente informado, pode ter um vislumbre do que seja o ambiente periférico, insalubre, desassistido, expurgado, enfim, adjetiva-lo não é uma tarefa das mais difíceis, o que é mais importante e que está nas entrelinhas é a falta de oportunidade ou investimento no humano, - ou seja, educação - jungido, há uma série de fatores, como convivência na geografia do estado paralelo, a carga axiológica trazida por essas relações intersubjetivas, isso tudo vai moldando o ser. Logo surge uma pergunta de caráter retórico: como uma criança que cresceu vendo tráfico de drogas, armas, dinheiro fácil acarretado pelo mundo do crime, falta de uma estrutura familiar, - geralmente tem um pai ou mãe drogado, as vezes e não raro, os dois - falta de assistência, falta de orientação, o convívio com a miserabilidade extremada etc., terá o pudor de não atentar contra outrem quando ele próprio foi deformado durante toda a sua vida? 

Dentro dessa indagação cuja resposta não agrada a sociedade, haja vista que ela passa pela responsabilidade direta de todo o corpo social, que surgiram os movimentos ligados à majoração das penas e a diminuição da maioridade penal para 16 anos, como se o aumento da punição pura e simplesmente trouxesse segurança e reflexão para aqueles que tiveram toda a sua vida negada pela falta de dignidade, pelos estigmas do submundo, e neles gerasse um anteparo que interromperia condutas delituosas; não sei se essa visão é apenas apedeuta ou ela esta ligada também à atrocidade para com seus pares, ou não se quer enxergar a verdadeira raiz do problema, ou mesmo, quem sabe, pareça óbvio que o simples aumento seja inibitório - sobre a obviedade, gostaria de citar Darcy Ribeiro, onde, no seu livro Sobre o óbvio, ele diz que o cientista é como alguém que procura tirar o(s) véu(s). Entre essas obviedades, existe uma que é a necessidade que o pobre tem que exista o rico, pois se ele não existisse, eles não teriam direito à esmola ou a emprego, portanto o rico é essencial para a existência do pobre; outra dessas, é a obviedade de que os negros são inferiores aos brancos já que esses despendem grande esforço para ascenderem na vida mas não conseguem, o que é evidente pela inferioridade intelectual, é óbvio.

Assim, qual a legitimidade que o Estado brasileiro tem para aumentar pena(s) e/ou diminuir a maioridade penal se a razão da existência do próprio Estado e do ordenamento jurídico, que é a promoção do princípio da dignidade da pessoa humana, é a principal vítima da inapetência dessa conjuntura de deficiências? Nessa brincadeira de poder, quem padece dos mandos e desmandos, infelizmente, é a população carente, estando ela sujeita às intempéries do destino, onde existem duas condenações preexistentes: o nascimento e a luta pelo direito de continuar vivo - esta última me parece muito mais uma penitência que um gozo. Hoje, as atuais discussões sobre o fim do anódino - programas sociais - ganha monta pelo fato da falta de providência mais percuciente por parte do Executivo, o que gera uma situação muito próxima à da Norte América na década de 80, o relato vem do livro de Loic Wacquant, Punir os Pobres, "No decorrer das três últimas décadas, ou seja, depois dos confrontos raciais que abalaram os grande guetos de suas metrópoles, a América lançou-se numa experiência social e política sem precedentes nem paralelos entre as sociedade ocidentais do pós-guerra: a substituição progressiva de um (semi) Estado-providência por um Estado penal e policial, no seio do qual a criminalização da marginalidade e a 'contenção punitiva' das categorias deserdadas faz as vezes de política social(...)De resto, o Estado penal que substitui peça por peça o embrião do Estado social é, ele mesmo, incompleto, incoerente e muitas vezes incompetente, de maneira que não poderia preencher as expectativas irrealistas que lhe deram origem nem as funções sociais que, tacitamente, ele tem a missão de paliar." Ainda no seu livro, ele traz dados sobre o aumento da criminalidade, o que gerou um aumento de 314%  na população carcerária.

O que está por baixo dessa estrutura são os fatores geradores do aumento da criminalidade: educação - ou a falta dela, ausência das condições de igualdade, preconceito, migração, crescimento populacional, desempregos ou subempregos. Antes de falarmos em quem delinque, é necessário apontar as falências das instituições governamentais, dos títeres eleitos por nós, o povo, e que são subservientes a um pequeno grupo detentor da vida, da morte e das consciências, para só então ganhar em legitimidade, onerar os pobres, - pois são os que mais são suscetíveis à prática de delitos, principalmente, os de pequeno valor, como furtos e roubos, os chamados "ladrões de galinha" - enquanto os sanguessugas da nação são mantidos no seio do poder, fazendo jus, fidedignamente, à expressão crime organizado. A mídia tem contribuído substancialmente para essa construção, fazendo apologia à vingança privada, - principalmente esses ditos programas jornalístico de cunho eminentemente policial - a linchamentos, sem falar nas cenas de pessoas dilaceradas, o que deforma o caráter das nossas crianças e até mesmo dos adultos, num movimento que desabona o sagrado valor da vida, banalizando-o. 

Agora, adentrando na especificidade do tema, uma das principais bandeiras levantadas por esse pragmatismo penal e que virou merchandising  político para cooptar votos, é a diminuição da maioridade penal, ganhando em notoriedade principalmente por que o vice na chapa do presidenciável Aécio Neves, Aloysio Nunes, do PSDB, é o autor da  PEC/33 - 2012, cuja justificativa por ele utilizada segue:          
“Não se pode questionar o fato de que sob a proteção deste mesmo estatuto (ECA), menores infratores, muitas das vezes patrocinados por maiores criminosos, praticam reiterada e acintosamente delitos que vão desde pequenos furtos, até crimes como tráfico de drogas e mesmo homicídios, confiantes na impunidade que a Constituição e o ECA lhes conferem. É o caso, por exemplo, de Genilson Torquato, de Jaguaretama, no Ceará, hoje já maior de idade e livre, assassino confesso de 11 pessoas, dos 15 aos 18 anos. Ou do adolescente de Maringá, conhecido como o “Cão de Zorba” que confessou ter matado 3 pessoas e teria encomendada a morte de mais 4. Ou ainda de M.B.F., o “Dimenor”, ligado à facção criminosa paulista P.C.C., que aos 17 anos confessou a morte de 6 pessoas a mando de traficantes, a primeira delas quando tinha apenas 12 anos de idade. Muitos hão de lembrar-se do menino “Champinha”, que comandou o sequestro e morte de um casal de jovens em São Paulo. Ressalte-se que este garoto já houvera sido assistido e recolhido por diversas instituições especializadas na recuperação de menores infratores, antes de praticar tão odioso crime. Mais recentemente, tivemos notícia do menor no Rio Grande do Sul, autor de 112 atos infracionais, no momento de uma audiência tentou matar a promotora de um dos seus casos. Compreendemos perfeitamente os riscos de se legislar em função de casos específicos, dando um caráter geral ao que poderia ser tratado de forma particular, especialmente em se tratando de reforma da nossa ainda jovem Constituição. Também somos contra o que se convencionou chamar de “legislação penal de urgência”, em que o legislativo se move motivado por tragédias ou crimes que chocam a comunidade, com grande repercussão midiática. Mas algo precisa ser feito em relação a determinados e específicos casos, que infelizmente têm se proliferado à sombra da impunidade e longe do alcance de nossas leis.”   

Essa justificativa é tão contraditória quanto ridícula, haja vista que nela estão elencados elementos que são paradoxais à própria propositura, como ser contra ao direito penal de emergência, mas em contrário a isso, cria uma "medida de emergência" que na realidade não o é, pois não tem o condão de mitigar o problema, mas acentuá-lo. Usando casos pontuais como argumentos de base e sustentáculo - tudo bem que essa é uma realidade inegável, mas ele próprio aponta que os mandantes desses crimes são os "dimaior". Claro, pois a nossa juventude se encontra à míngua, localizando nessa "família" o preenchimento das lacunas cujo bafio deixa um rastro que se seguido encontra concepção em Brasília. Nós temos um Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que não tem a mínima observância pelos poderes, a corrupção corrói os setores políticos, as nossas universidade estão sucateadas, a educação de base e média não funciona, e esses escroques vem falar em aumento da violência quando o produto dessa consequência tem sua raiz na sua própria inépcia e irrisão à sociedade? Pura chicana! Eu poderia aqui apontar as impossibilidades jurídicas ligadas aos Direitos e Garantias Fundamentais, mas julguei de melhor valia uma análise mais social do problema, alhures da visão mais tratadista e normativa da cousa. 

Não me entendam mal, não sou a favor das barbáries cometidas seja ela por quem for, mas o Direito Penal é a última ratio e ele não tem a função de endireitar os problemas sociais, estas devem advir de políticas públicas de qualidade, pois não é na criminalização desenfreada que encontraremos solução para os problemas estruturais da nossa nação - só para trazer uma nova discussão: antes de criar novos padrões penais, quantos crimes tem seus agentes identificados? Quantos inquéritos policiais tem sujeitos definidos? Qual a taxa de eficiência desses inquéritos? Quantos crimes foram e são arquivados por falta de investigação ou mesmo nunca chegaram a ser abertos? Essas perguntas me parecem mais relevantes, pois como se pode falar em movimento de criminalização se o problema ululante é a impunidade? Temos que refletir o cotidiano, descortinar as certezas, buscar o íntimo da celeuma para não ser leviano e desmistificar as "verdades" vendidas por aqueles que não tem o escrúpulo ou à percuciência necessária para identificar soluções pontuais e eficazes.         

Por Jessé Rebouças